terça-feira, fevereiro 20

Meu Irmão

Ele sempre foi um cara estranho, um verdadeiro mistério pra mim, tem seis anos a menos que eu, o que na infância criava um verdadeiro abismo afinal ele era o chato da turma, o pirralho eternamente colado na minha sombra. Sempre foi um garotinho lindo, com olhos azuis cintilantes e uma eterna cara de sem-vergonha, o mais irônico é que aquele sorriso maroto escondia o menino mais tímido que eu conheci, alguém que legitimamente teve que “pegar no tranco”. Na adolescência cada um seguiu seus rumos e pelas loucuras da minha cabeça acabei indo parar em Florianópolis, o tempo passou e o cara acabou indo morar comigo, é a partir daí que passamos a nos conhecer e acabamos nos tornando amigos.
Logo que chegou tenho certeza que passou por maus bocados, já que encontrou um irmão envolvido numa relação que infelizmente fazia mal pra todo mundo, o pior de tudo é que nunca pedi desculpas por ter colocado o cara de pára-quedas nesse furacão, a maior ironia foi que em uma hora que tudo deu errado pra mim nessa história que estava mais do que fadada ao fracasso, a única criatura que passou por tudo junto comigo foi justamente esse garoto que não tinha nenhuma responsabilidade sobre ela.
O que mais admiro no Roger é a capacidade de inventar coisas, sejam pro bem ou mal, se bem que esse também é um dos maiores defeitos dele. Se eu reclamo das minhas relações amorosas, com certeza a família tem um sério problema com isso, o que meu irmão nunca descobriu é que eu sempre soube porquê ele não engrena um namoro. Se às vezes acho que eu tenho um carimbo escrito CUIDADO na minha testa, tenho certeza que o carimbo dele vem junto com um luminoso daqueles se usa em boate de strip-tease.
Morar com outras pessoas sempre foi um problema pra mim o que não ocorre quando estamos morando juntos, é a criatura mais desorganizada que já foi colocada nesse mundo, não tem absolutamente nenhum talento na cozinha, vive sumindo pra ficar nem sempre com as melhores companhias, mas é melhor pessoa que já conheci no mundo pra se conviver, olha que eu tenho propriedade pra falar disso. Fico um pouco chateado quando ele se sacrifica pra agradar amigos que se aproveitam de um coração maior que o mundo, sou meio coruja mesmo, e olha que se tem alguém pra quem esse moleque já aprontou, sou eu. Família é isso, um eterno exercício de paciência, claro que o amor incondicional facilita tudo.
No início disse que meu irmão sempre foi um mistério pra mim, mas é mentira, a vida dele é um livro mais que aberto aos meus olhos, esse eterno menino sempre se espelhou em um cara mais velho que ele, com um estranho hábito de cometer bobagens que chega a dar vontade de gritar: Você é muito melhor que eu, começa a acreditar mais em ti! Não era pra sair tão meloso assim, mas acho que descobri a razão que me levou a nunca escrever sobre o Roger: É difícil escrever a respeito de alguém que eu amo mais que a mim mesmo.

domingo, fevereiro 18

Pensamento=Sentimento

Sempre converso sobre sentimentos e do quanto essa “vida moderna” tem dificultado entender, apreciar e gozar das tais avalanches de sensações. Muitos de vocês que lêem minhas crônicas e me ajudam a entender um pouco do que falo (muitas vezes mais por divagação que por conhecer) com seus e-mails, scraps e comentários também mostram o mesmo inconformismo. Creio que tanto eu quanto você ainda não tínhamos pensado em uma razão pra toda essa imaturidade, essa leviandade e foi sem querer que ela caiu no meu colo.
O meu trabalho “normal” sempre me leva a conhecer novas pessoas, treiná-las, fazer delas vendedores de sonhos e em um desse treinamentos onde o público era da faixa etária de 17 até 19 anos, conversavamos sobre talento; então foi mostrada a eles fotos de celebridades reais (não esses retardados de big brothers): Mandela, Ghandi, Ayrton Senna e Einstein, então perguntamos quem eram essas pessoas. O único identificado foi o Senna e só por ser brasileiro. Agora você pode me perguntar: “E o que isso tem a ver com sentimento?” Tudo meus queridos, tudo.
Sentir é algo muito complexo, são milhares de coisas acontecendo ao mesmo tempo, diversos sabores, é preciso ter no mínimo capacidade de buscar entender, pra isso é preciso um mínimo de pensamento, de cultura, tudo o que está em extinção na nossa “sociedade do futuro”. Estamos sem memória e a pior parte é saber que quem vai comandar o mundo amanhã não sabe nada sobre nada, estou horrorizado com o estado mental dessa galera teen: Sabem quem apareceu nú na novela, quem está transando com a famosa da semana e não fazem a mínima idéia do que foi o AI-5.
Não é difícil entender porque a família tem se tornado uma instituição mais falida que nunca. Estar com alguém envolve outras coisas além dos peitos e do bíceps, precisa querer entender o outro, pra isso o mínimo de cultura, de saber pensar e é exatamente isso que essa cultura da produção a qualquer custo tem tirado de nós. O negócio é ficar cada vez mais parecido com uma máquina, executar mais e pensar menos, não é de admirar que conviver com outra pesoa esteja tão difícil, ao invés de se completarem elas competem, no lugar de amar apenas transam e o pior de tudo: nem se namora mais, se “fica”. Tudo orgânico, instinto, coisa de bicho mesmo, ser humano está cada vez mais difícil, afinal pra ser realmente um humano antes de mais nada é preciso pensar. Lembram que isso era o que nos tornava especiais, eis a resposta....
Aguardo seus e-mails.

P.S.: O Crônicas e Boemia tem agora uma comunidade no orkut
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=27350968

sábado, fevereiro 3

Novos Desgarrados.

Em primeiro lugar preciso pedir desculpas a você que visita regularmente o crônicas e boemia, mas vou ser honesto, estava precisando tirar uns dias de folga, deixar de olhar um pouco pra esse mundo cada dia mais estranho que me cerca, me aperfeiçoar em minha nova paixão (acreditem ou não, depois dos 30 voltei a andar de skate), enfim, dar um tempo pra cabeça.
Às vezes parece que recebo uma entidade que mostra alguma bobagem ou coisa mais séria que eu nunca parei pra notar antes, essa semana tive um desses insights olhando pra um mendigo que perambulava aqui pelas ruas de Porto Alegre, lembrei de uma antiga música do grande Mário Barbará que fala desse desgarrados que perambulam pela capital gaúcha, não sei ao certo o que me deu, parece que recebi um soco no estômago e me vi pensando na vida desses que quase nem vida tem mais.
Deve ser muito difícil sentir sua dignidade escorrer gota a gota pelos dedos e ver que a cada dia você está deixando de ser quem um dia foi, vejo que a maioria deles carregam sacolas, quem sabe com fotos, lembranças ou outros farrapos que restaram de uma outrora época de sorrisos, quem sabe beijos apaixonados, paixões fulminantes - dessas que adoro falar. Pois é, desde então dei pra pensar no peso das nossas escolhas, do quanto um “sim” ou “não” pode mudar toda a nossa história, a opção errada pode fazer um estrago que talvez não possa ser consertado. Não tenho dúvida alguma de que a grande maioria lembra do exato momento em que aquele “sim” ou quem sabe o “não” mudou tudo à sua volta, um casamento desfeito, o primeiro gole, o sonho de enriquecer na capital ou outras das milhares de opções que revelaram-se como erradas.
Fiz um monte de cagadas e lembro de cada uma delas, pra falar a verdade não tenho como negar que Deus existe e gosta de mim pra caramba, porque em algumas dessas besteiras só com a mão do “homem” consegui me salvar. Sei que estou parecendo meio brega, não sei se é a crise dos 30 ou quem sabe uma estranha necessidade de namorar que já está me enchendo o saco. O que não consigo é parar de pensar é o quanto escolher bem é importante, tá certo que não quer dizer que você vai acabar morando na rua, talvez você perca alguém que você só vai descobrir o valor que ela tinha quando não a tiver mais por perto, também pode ser um emprego, um amigo, uma viagem ou qualquer outra coisa que por mais pequena que possa parecer, vai refletir muito algum dia.
Gente, não estou nem um pouco a fim de escrever uma crônica de auto-ajuda, seria muita cara-de-pau da minha parte, mais que o de costume com certeza, só que não posso calar minha boca, estou com vontade de dizer: pense mais, escute mais e fale menos. Hoje em dia todo mundo quer falar, falar e falar, sem pensar se aquilo vale a pena ser dito. Vivemos uma época de corpos cada vez mais generosos e idéias escassas. Vai me dizer que toda essa história de esquecer que o cérebro também precisa de ginástica não vai ter um preço amanhã. Escolhas meus queridos, ESCOLHAS.
Acho que tenho muita sorte por ter nascido em uma das últimas gerações que teve a chance de aprender a pensar, não apenas reagir ao mundo de uma forma servil, quase um cachorrinho, honestamente a vida se esforçou pra me fazer ter sucesso, se ainda não cheguei lá é pela minha incompetência mesmo e hoje eu pergunto pra você: Se com tudo que a vida nos deu de bagagem pessoal, ainda escolhemos errado, o que vai ser de uma geração que tem como ídolo maior a bunda dura da semana?
Aguardo as respostas por e-mail....